Sou fascinado por espirais. Como muita gente, é verdade.
Lembrei-me delas a ver a peça Coleção de Colecionadores, de Raquel André, onde
esta entrevista vários colecionadores e acaba entrevistar-se a si própria,
enquanto colecionadora de colecionadores.
A espiral está na base de muitos artefactos humanos, como as
lentes, as molas, os parafusos, as hélices, a sequência de Fibonacci, e também de
alguns objetos singulares da natureza, como búzios, cornos de animais, pénis de patos, redemoinhos, tufões e galáxias.
Ao contrário da simplicidade da linha reta, a espiral é a
geometria da obsessão, da busca de cobrir miudamente um tempo ou um espaço
de forma racional, explorando todas as suas possibilidades, sem deixar mistério por revelar.
Um colecionador é alguém que faz uma espiral num pequeno
botão do universo, percorrendo um ponto da existência ao outro sem
deixar nada ao acaso. É uma aproximação a alguma coisa ou a alguém, e por isso
quase todos os colecionadores de Raquel André colecionam a sós,
mesmo quando pertencem a famílias de colecionadores. Por vezes, podem ser
formas de percorrer a vida em direcão a outro colecionador, como o caso de filhas que continuam a coleção dos pais, ou do marido que coleciona as flores favoritas da esposa.
Dito assim, o colecionismo pode parecer uma forma de amor,
mas suspeito que quase todas as ações humanas são alimentadas por sentimentos amorosos. O
colecionismo talvez seja apenas a mais geométrica das formas de amar.