O totalitarismo das listas



As listas, são ferramentas de dominação do mundo e da vida. São bulldozers que aplanam a paisagem para permitir aos viajantes irem mais depressa de um ponto ao outro da geografia que já conhecem. Formas de limpar as irregularidades do quotidiano para tornar todos os dias azuis, ou todos os dias negros, ou todos os dias assim assim. Modos de dizer que a forma como eu vejo o mundo é mais importante do que o próprio mundo.
Talvez isso explique a obsessão das listas de final do ano, que permitem reduzir o caos e o desconhecido de uma revolução completa da Terra em torno do Sol a uma dezena - quase sempre - de imprescindíveis, incontornáveis, inesquecíveis ou inamovíveis obras de um determinado ano.
Estando há anos convencido disto, é com espanto que descubro uma lista que, mais do que totalitária, é uma vertigem amorosa.
A lista de livros do blogue Antologia do Esquecimento é uma obra-prima das listas: de gosto, de atenção, de devoção aos livros. Porque não é uma lista de unidades, ou generalidades, que são quase sempre fruto do esquecimento ou da indiferença, mas é uma lista de minudências, de pormenores, como a lista de deslumbramento que o amante faz perante o corpo amado, o ser que se conhece intimamente e ainda não perdeu o seu fascínio. Enfim que demonstra como é bom abandonar a doença de nos perdermos em nós próprios para podermos vaguear sem fim pelos campos da paixão.