Era uma vez em... Hollywood





Tarantino não é um cineasta político, mas um cineasta de cinema. O prazer dos seus filmes é o prazer de uma criança a explorar o seu brinquedo favorito. E por isso os seus filmes mais louvados pela suposta dimensão política - Sacanas Sem Lei, Django Libertado - só foram políticos ao nível da mais elementar revenge fantasy. Pelo contrário, Era uma vez em... Hollywood é um filme político, um conto de fadas reacionário, que recorda com nostalgia o heroísmo machista e dorido do audiovisual norte-americano dos anos 50, em confronto com as hippies do culto de Charles Manson, que nos são mostradas como sexualmente livres, a dominar os homens, a querer atacar  a violência de celulóide ao mesmo tempo que se dizem vítimas dela, mas também a insultar impotentes a personagem do duplo musculado de Brad Pitt, como certamente Tarantino suspeitava que o seu filme seria insultado pelos ativistas do feminismo interseccional.
E, nesse aspeto acabou por ter razão, pois estes, em vez de apontarem baterias à representação insidiosa que lhes é feita no filme, acabaram por se concentrar no número de deixas da personagem Sharon Tate, como se as personagens mais fascinantes da história do cinema não tivessem sido também das menos faladoras ou com menos tempo em cena (pense-se no Kurtz de Apocalipse Now, ou Harry Lime, de O Terceiro Homem). E a acusação torna-se particularmente constrangedora pois não só a Sharon Tate de Tarantino é das suas personagens femininas mais interessantes desde Jackie Brown, como está longe de tentar ser o retrato realista de uma mulher, antes sendo uma princesa de conto de fadas de celulóide, que vive de ser vista pelos outros e de se ver a si própria no ecrã, enquanto sonho do cinema que já só existe na cabeça de Tarantino.