Respirar teatro


 

Faleceu o encenador Moncho Rodriguez. Simultaneamente galego, brasileiro e português no seu modo de ser, era uma figura fascinante, com quem colaborei há uns anos.

Era um homem baixo, franzino, de rosto adelgaçado num sorriso que parecia eterno e eternamente exausto. O corpo pequeno parecia mal conseguir conter a energia e ânsia que pareciam dominá-lo. O Moncho era um homem sempre à beira de saltar um precipício invisível.

Era, também, um sedutor. Um grande sedutor, que punha na pessoa com quem falava todo o encanto e urgência de uma paixão. Como todos os grandes sedutores, estava muito longe de ser um santo, o que talvez tenha sido a causa da sua carreira errática, apesar do seu imenso talento para mover multidões, para levar atores e atrizes ao êxtase da transformação. Como todos os grandes encenadores, o Moncho era apaixonado por atores, e especialmente por atrizes, paixão essa que, na fronteira dúbia entre vida e teatro em que vivia, podia dar espectáculos soberbos ou desastres.

A mesma paixão se encontrava no seu trabalho com as comunidades. Para o Moncho, as comunidades ainda eram o povo mítico e inocente do folclore romântico, simultaneamente anónimo e descartável, divino e inspirador. Os seus espectáculos eram celebratórios, mas raramente eram celebratórios da própria comunidade, antes celebratórios do teatro, que foi a grande paixão de Moncho, para o qual ele viveu e morreu, provavelmente sem hesitações e sem remorsos.

Dele levo uma frase que disse um dia, de cabeça baixa, cansado, perdido no meio de mais um processo intenso e interminável: não interessa aquilo que fazemos, interessa aquilo que deixamos atrás de nós.

E, o Moncho, apesar dos seus defeitos, dos seus erros, deixou muito atrás de si: admiradores, seguidores, discípulos, imitadores e, principalmente, teatro.