O mundo medieval de Sara
Sara, a passar na RTP2, é uma série com elevados padrões de produção, atores sólidos, e um prazer evidente na citação, desde citar diálogos de telenovela até à figura de Manoel de Oliveira enquanto realizador.
Todavia, apresenta uma estrutura narrativa pícara, em episódios, que serve, maioritariamente, para justificar uma série de sátiras desgarradas ao mundo mediático de hoje.
E cada uma dessas cenas, de maior ou menos eficácia humorística, assenta no contraste entre uma personagem de recorte naturalista - normalmente a protagonista Sara - e uma personagem caricatural e excessiva, perante a qual a primeira não consegue controlar o seu espanto, como se Sara fosse pouco mais do que o alter ego de Bruno Nogueira a enviar uma piscadela de olho cúmplice ao espectador, perante a tolice do mundo.
Esta é uma estrutura bastante clássica, de origem medieval, destinada a rir perante o "desconcerto" e a "vaidade" do mundo. Foi uma estrutura amplamente usada por Gil Vicente nas suas peças humorísticas, e que marcaram o teatro de forma duradoura.O divertido é lembrar que ainda há poucos meses estas mesmas peças de Gil Vicente foram há tempos desdenhadas publicamente pela atriz principal desta série, como sendo “boçais, limitadas e primárias”, de histórias “popularuchas", e "personagens tão bi-dimensionais como um papel em branco”.
Será isto uma tentativa de matar o pai?