A família é um lugar estranho
O Japão é o lugar do exótico ocidental. Tal como há quase 20 anos Sofia Coppola foi lá filmar Lost in Translation, para transmitir a incompreensibilidade do amor romântico, Werner Herzog descobriu no Japão o palco para explorar o desconforto das relações afetivas de hoje.
Family Romance, LLC é o nome do filme e é o nome da empresa que é dirigida pelo ator que protagoniza o filme. Yuichi Ishii dirige uma empresa que fornece pais, maridos, namorados, amigos, admiradores a fingir aos seus clientes. Neste filme Herzog retrata-o em situações encenadas a fazer aquilo que promove: a fingir ser pai de uma adolescente, a fingir ser um empregado que cometeu um erro, a fingir admirar uma vítima das redes sociais, a fingir ser o morto num funeral. Em suma, a tomar o lugar fantasmático das relações humanas: o lugar do outro que se deseja, de que se precisa, que gostaríamos que preenchesse a nossa vida.
E, ao fazê-lo, Ishii, inconscientemente, e Herzog, com deliberação, escancaram a estranheza das próprias relações humanas, feitas tantas vezes de imposturas, fingimentos, de se colocar no lugar de desejo e necessidade do outro, mesmo quando esse não é o lugar da verdade, o lugar daquilo que realmente se é. Como as relações fossem sempre proximidades baças entre solidões.