Casa portuguesa


O inverno português não é glaciar, mas também não tem graça nenhuma. Traz-nos um frio húmido, cortante, que se infiltra nas paredes das casas de má qualidade em que vivemos há décadas, fura as janelas mal isoladas, as portas de alumínio baratucho, os telhados mal vedados, nos entra pela roupa adentro, derrota mantas, cobertores e até botijas de água quente, e nos entorpece os pés, paralisa as mãos, transforma narizes em estalactites, até invadir os nossos pulmões e nos trazer constipações, gripes e pneumonias.

O inverno português é uma organização terrorista, que impede a sociabilidade, interfere com o comércio, deixa o mais voluntarioso trabalhador de cama, afeta a produção nacional, prejudica até a reprodução nacional e afugenta os estrangeiros, que esvoaçam para fora do país tais andorinhas, estupefactos com um país com fama de ameno, mas afinal pode ser tão gélido como a proverbial Sibéria.

É um dado factual que Portugal tem as eletricidades e gás mais caros da Europa, se ajustarmos ao rendimento por pessoa. E é, depois da Alemanha e da Dinamarca, o país onde se paga mais impostos sobre a energia. É também o país que tem as construções mais antigas, depois da Irlanda e do Chipre, e onde 80% das casas são mal isoladas, o que faz com que seja o país com mais casos de humidade, infiltrações e bolor, só ultrapassado pela Turquia e pelo Montenegro. O pior país da Europa Ocidental para se conseguir aquecer uma casa, só equiparável a Bulgária, Hungria e Eslovénia.

Viver numa casa portuguesa é um ato heroico de sobrevivência. E não há pão e vinho que nos salve.